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YOGA, UMA ECOLOGIA INTERIOR

  • Foto do escritor: Marcelo Augusti
    Marcelo Augusti
  • 28 de mai.
  • 8 min de leitura

Atualizado: 30 de mai.

Quando nos compreendemos, quando compreendemos a nossa consciência, compreendemos também o universo e a separação desaparece (Amit Goswami)


Compreender o que é a Consciência, não é algo que se faz por especulações filosóficas ou achismos e opiniões.


A especulação filosófica, embora investigue a fundo a existência a partir de diferentes perspectivas sobre a realidade, não necessita a comprovação de suas reflexões.


Sobre o achismo e as opiniões, afirmou o filósofo Cortella:   


O fenômeno do achismo é um verdadeiro problema da nossa realidade. As pessoas querem ter opinião para tudo, mas será que elas se preocupam em fundamentar as opiniões? Por qual motivo a ciência é tão questionada e, em muitos casos, até negada pelos indivíduos? Afinal, sua opinião não é a verdade absoluta.


Compreender a Consciência, portanto, está além da mera especulação - ainda que filosófica – e muito mais além dos achismos e das opiniões.


Nas palavras de Ken Wilber:


A Consciência não é um conceito, mas a experiência mais íntima com nossa interioridade espiritual, e tão próxima de nós que, quando a percebemos, não é possível descrevê-la em palavras. Por isso se diz apenas com o que ela se parece, mas não o que ela é, pois o que ela é não pode ser analisado intelectualmente sem envolver contradições lógicas.


A Consciência, pois, não é um conceito. Conceito é uma representação mental e linguística de um objeto, seja ele abstrato ou concreto.


O conceito é uma tentativa de explicar a realidade por meio de formulações verbais. É uma elaboração intelectual de algo que acreditamos ter apreendido, porém, parcialmente, pois, não compreendemos esse algo em sua amplitude e profundidade.


O conceito é um modo de identificar, descrever e classificar tudo aquilo que consideramos ou não ser real, independente da experiência. Trata-se, pois, de uma ideia sobre algo, que resulta em uma teoria sobre o mesmo.


Porém, Consciência é uma experiência pessoal com a mente. E a mente pode ser observada diretamente. Se investigarmos a mente, compreenderemos a Consciência.


A mente, portanto, é o objeto que, ao ser investigado e conhecido, possibilita a compreensão da Consciência. Pois é pelo exame minucioso da mente que se revelará o contraste entre o real e o aparente, entre aquilo que é e aquilo que acreditamos ser o que é.

 

Muitos céticos, por não terem uma experiência pessoal com a mente, recusam-se a aceitar os ensinamentos ancestrais daqueles que conheceram a mente e compreenderam a Consciência.


Tais indivíduos, por não compreenderem o que não entendem, somente conseguem explicar a realidade pela lógica cartesiana. Mas a Consciência não se reduz aos pressupostos de uma dedução formal.


Porém, mesmo assim, sem qualquer experiência pessoal ou conhecimento, tais indivíduos especulam e emitem opiniões, sempre tentando provar o contrário daquilo que não compreendem.


A experiência da mente é uma ciência. E esta ciência se denomina Yoga. Os procedimentos da ciência do yoga são idênticos aos métodos científicos: observação e experimentação.


Por isso, o yoga não é uma filosofia, uma psicologia, uma religião ou uma teoria; yoga é um conjunto de experiências científicas, no sentido mais rigoroso do termo. Quem segue suas regras à risca e suas técnicas adequadamente, conhece a mente e compreende a Consciência.


A experiência pessoal com a mente se realiza por uma percepção mística da realidade, isto é, transcende a percepção sensorial e o pensamento, e promove uma experiência direta e imediata com o objeto observado.


Transcendente é aquilo que está além dos limites da realidade física, além do visível, do tangível e perceptível aos sentidos, e da própria compreensão intelectual.


Uma experiência com a mente, em seu mais amplo e profundo espectro, é, pois, uma experiência transcendental. Trata-se de elevar-se a um nível de interação puramente intuitivo.


Quando se retorna dessa experiência, o que fica é uma sensação de plenitude com algo maior do que si mesmo. Pois transcender a mente é estar acima do dualismo sujeito-objeto que a tudo fragmenta. Isto é a Consciência: aquilo que a tudo abrange e integra.


Elevar-se para além do movimento e da agitação da mente, é alcançar a Consciência; pois a Consciência é tranquilidade e quietude.


Aqueles que transcenderam a mente, independentemente de qualquer época ou parte do mundo, são unânimes em seus relatos, e suas afirmações são impressionantemente universais: a Consciência é a Unidade inesgotável que se multiplica na infinidade da diversidade.


Compreender a Consciência é permanecer no nível mais elevado da Existência. A vida ao nível da mente é a vida do sofrimento, das mentiras, dos prazeres efêmeros, da vaidade, da violência, das superficialidades, das opiniões e crenças de todos os tipos. É uma vida agitada, incompleta e de intensa busca.


Mas a vida ao nível da Consciência é infinitamente abundante, generosa, natural e plena. É uma vida simples, tranquila, sem apegos ou aversões, e sem buscas.


A pergunta que a ciência do yoga nos convida a fazer é: o que estamos fazendo para sermos dignos da vida que nos foi concedida?


Afinal, a maioria dos humanos, se volta contra o planeta em que vivem: poluem a água, a terra, o ar; destroem e matam tudo o que podem, seja gente, seja bicho, seja planta.


Mentem e se apoiam em suas mentiras, apenas para “se darem bem”. Oprimem e exploram os mais vulneráveis, desacatam as regras da boa convivência social, promovem todos os tipos de maldades.


Todo esse comportamento egoísta vem do lixo e da sujeira que acumulam em suas mentes. Estão poluídos por dentro. É necessário, pois, fazer uma “faxina na casa”, limpar e arejar a mente.


Purificar a mente é o “caminho do yoga” – yogamargah – um caminho de excelência e sabedoria. Ele nos conduz por uma ecologia interior, que purifica os pensamentos, as ações e as palavras.


Ecologia é um termo atribuído ao biólogo alemão Ernst Haeckel. Em 1869, ele definiu ecologia como a ciência capaz de compreender a relação do organismo com o seu ambiente.


Considerando a origem da palavra, ecologia vem do grego oikos, cujo significado é “casa” ou “lugar onde se vive com a família”.


Podemos dizer que a casa é a estrutura fundamental em que se constitui a unidade básica de uma coletividade; ela é o lugar onde as pessoas habitam, recolhem-se após um dia de trabalho, sentem-se seguras, relacionam-se afetuosamente com os seus pares.


A casa é o “lar”, um termo que se acredita referir a uma parte específica da casa, ou seja, a lareira. Os seres humanos, desde a mais longínqua antiguidade, reuniam-se ao redor do fogo, seja para se aquecer, preparar o alimento ou repousar. A lareira representa o aconchego e a segurança do calor e da luz, diante do frio e da escuridão lá de fora.


Quando se fala de uma ecologia interior, portanto, referimos à importância de cuidar da nossa casa, isto é, do nosso “mundo interior”, para que possamos agir de forma consciente e responsabilidade no “mundo exterior”.


É no mundo interior que habitam os pensamentos, emoções, sentimentos e sensações. E esta “casa” precisa estar sempre em ordem, ambiente tranquilo, limpo e arejado, para que esse mundo interior seja acolhedor, convidativo ao recolhimento e ao repouso, seguro e gratificante.


Vejamos o que diz um adepto da ecologia interior:


Examina a tua mente. Está despoluída de ambições desmedidas, preguiça intelectual e intenções inconfessáveis? Teus passos sujam os caminhos de lama, deixando um rastro de tristeza e desalento? Teu humor intoxica-se de raiva e arrogância? Por que teu temperamento ferve com frequência e expele tanta fuligem pelas chaminés de tua intolerância? Não desperdice a vida queimando a tua língua com as nódoas de teus comentários infundados sobre a vida alheia. Livra a tua vida de tantos lixos acumulados. Atira pela janela as caixas que guardam mágoas e tantas fichas de tua contabilidade com os supostos débitos de outrem. Vive o teu dia como se fosse a data de teu renascer para o melhor de ti mesmo - e os outros te receberão como dom de amor. Pratica a difícil arte do silêncio. Desliga-te das preocupações inúteis, das recordações amargas, das inquietações que transcendem o teu poder (Frei Betto)


O yoga, portanto, é uma ecologia interior, pois trata de um cuidar da nossa natureza interior, bem como das nossas relações com o mundo “lá fora”. O yoga torna o nosso mundo interior um lugar saudável e seguro para acolher qualquer pessoa que necessite de amparo e proteção.  


Como foi dito, a mente é o objeto de investigação da ciência do yoga. O método é a observação atenta. E a técnica utilizada é a meditação. Mas o que observar com a meditação?


Observar a mente nos leva a perceber o ir-e-vir dos pensamentos e das imagens que, assim como se formam espontaneamente, assim se dissipam. É esta observação, que se faz com plena atenção, em quietude e silêncio, que evidenciará a nossa natureza interior ou essência.


Interessante que a palavra essência, do alemão Wesen, significa “permanecer em um lugar”. Essência é aquilo que remete ao duradouro e estável; ela é uma morada, no sentido mais profundo de uma interioridade que guarda algo valioso.


Essência, portanto, é aquilo que resiste e perdura, é o imutável. E como morada, ela é habitação permanente, que em si e por si é sempre única, indivisa. A essência é, portanto, inerente à ecologia interior.


Quando os conteúdos da mente são observados, podemos ver, claramente, o quanto ela está poluída pelos próprios pensamentos que se acumulam e a intoxicam. E não há espaço para ver nada além da própria mentalidade poluída.


É esta mentalidade poluída que configura o modo como percebemos o nosso mundo interior e o mundo exterior, como expressamos nossas emoções e sentimentos, como nos relacionamos com as outras pessoas e demais seres vivos.


A mente poluída é uma mente envenenada pelo apego (raga), pela aversão (dvesha) e pela ignorância (moha). São esses “venenos” que perturbam a tranquilidade, corrompem a paz, destroem a harmonia, e não nos permitem o fluir da sabedoria, da compaixão, do amor e da felicidade.


Esses “venenos” impedem a experiência mística da mente em toda a sua amplitude e profundidade, pois obstruem a percepção intuitiva que leva à compreensão da Consciência.


A mente poluída é, portanto, a mente egóica; pois o ego é uma “falsa consciência”, um beco escuro que fará de tudo para impedir que a Consciência emerja com toda resplandecência, e revele toda a farsa do impostor.


Assim, observar com atenção a mente, deixar fluir os pensamentos sem em nada interferir, ser apenas a testemunha de seu movimento, liberta a mente de tudo o que obstrui a sua clareza e transparência originais.


É somente neste estado de clareza e transparência que a luz da Consciência resplandece na mente. E quando a luz da Consciência se reflete na mente, o ego é pego em sua falsidade, e o “Eu Sou” - a Essência - transparece em toda a sua serenidade e harmonia.


Afirma-se nas escrituras:


Aquilo que não é explicado pela fala, mas aquilo pelo qual a fala é revelada. Aquilo que não pode ser visto pelo olho, mas aquilo pelo qual quando vejo, enxergo. Aquilo que o ser humano não ouve com o ouvido, mas aquilo pelo qual o ser humano compreende escutando. Saiba que tu és isso - Consciência Pura e Ilimitada (Katha Upanishad, I, 5-9).


Yoga é o convite para "limpar" a nossa "casa". É o conhecimento perfeito que brota da razão (manish) e da sensibilidade (kavi). Pois não é ao “pé-da-letra” que se aprende, mas aos “pés do mestre” (upanishads) que se escuta a “voz do silêncio” (Mauna), ressoar em nós.


Yoga: estude, pratique, viva.


Hari Om Tat Sat.

 

Ó mente, você foi despertada pela meditação. Agora que você perdeu a falsa característica de um 'eu', você existe como o ser supremo ou a Consciência Infinita, livre de todas as limitações e condicionamentos. Pela investigação de ti mesmo, a ignorância foi dissipada pela sabedoria. Agora você conhece e compreende: só a Consciência existe, só ela e nada mais. Eu sou a Consciência Infinita que aparece como Universo (Yoga Vashistha, V:84)

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