YOGA, SEXO E A REALIZAÇÃO DIVINA
- Marcelo Augusti
- 4 de dez. de 2024
- 7 min de leitura

Não existe oposição entre você e a realidade. Você é parte dela, então, não entre em conflito e nem se oponha à natureza. Use a natureza para ir além da natureza: seu corpo, seus instintos, seus desejos. Não crie uma lacuna entre o mundo e o nirvana. Aceite a natureza como ela é, permita-se dela desfrutar. Mas esteja sempre consciente, mova-se na natureza com plena consciência. E quando isso acontece, você transcende o desejo, você está nele e ainda assim não está nele. Você passa por ele, mas não permanece nele (Osho).
Yoga é a união de algo, aparentemente oposto: Terra/Céu, Humano/Divino, Macho/Fêmea, Matéria/Espírito, Dia/Noite, etc. Sim, aparentemente oposto, pois, em verdade, nada está separado, a não ser na aparência.
Se Terra/Céu, Humano/Divino, Macho/Fêmea, Matéria/Espírito, Dia/Noite, etc., fossem, de fato, de naturezas distintas, separadas, nada poderia uni-los. Quando se diz que yoga é “unir”, isso significa dissolver os obstáculos à compreensão correta de que Realidade é Unidade.
Unidade significa que algo não é separado, e não pode ser dividido. A separação e a divisão são ilusões de uma realidade aparente. A Unidade é o Real, a verdade que subjaz ao mundo fenomênico.
Unidade é harmonia. Perceber a Unidade na diversidade, é viver em harmonia com todos os seres. E a expressão máxima da harmonia é o amor. E a plena manifestação do amor, entre os seres humanos, é o sexo.
No yoga, a realização do amor pode ser alcançada por duas vias: a da renúncia e a da entrega. A renúncia é a supressão de todos os desejos, uma luta contra a natureza, uma completa liberação do mundo para o encontro com o Divino. A entrega é uma aceitação, um não se opor à natureza, e que se faz por inteiro, onde se busca o encontro privilegiado com o Divino.
Portanto, a realização do amor pelo yoga, tanto pode ocorrer pela renúncia ao sexo, quanto pode acontecer pela entrega à experiência do sexo. Porém, o sexo é uma questão complexa, mesmo nos dias atuais, onde, por maior que seja a liberdade sexual e por mais direitos que foram conquistados para expressar e exercer a sexualidade, o sexo ainda não é aceito como algo natural, mas sim, um tabu.
Tabu é a proibição de uma prática que pode se referir a qualquer coisa. O tabu é uma violação moral de uma regra social que fere os costumes coletivos, geralmente imposta por uma autoridade religiosa e enraizado na cultura.
Quando se diz que algo é um tabu, há dois significados: que algo é perigoso ou impuro, ou que é sagrado e, portanto, proibido o seu contato ou prática. Violar um tabu é “quebrar a regra" do jogo coletivo; é avançar por sobre uma advertência, seja por meio de ação, palavra ou comportamento.
Para as antigas coletividades, violar um tabu era pôr em perigo toda a vida comunitária, cuja sorte, então, ficaria à mercê do sobrenatural; quebrar a regra era desconsiderar uma tradição mítica, um ritual religioso ou um costume, cuja origem, havia se perdido no tempo, e somente os mais antigos é que detinham o conhecimento.
Violar um tabu era insurgir-se contra as divindades, contra os espíritos de outros mundos e contra a memória dos antepassados. Por isso, e pelo perigo provocado à normalidade da vida coletiva, o transgressor caía em desgraça e era expulso perpetuamente da comunidade.
O tabu é um modo de domínio e controle da coletividade. Quando as pessoas não tem a compreensão correta de algo, há o medo de se cometer uma violação às regras instituídas. Este é o caso do sexo, estabelecido como “pecado” pela religião. Quando o sexo torna-se restritivo à determinadas circunstâncias ritualísticas, ele não traz felicidade, mas gera desconfiança, ansiedade e temor.
O sexo como pecado talvez motive mais à sua renúncia, do que à sua entrega como algo sagrado. A renúncia, todavia, sempre exige do adepto uma postura inabalável diante da natureza. Pois a elevação ao Divino, pela via da renúncia, se faz pela negação daquilo que é natural ao Humano. A renúncia é o caminho da negação da natureza humana.
A questão do amor e, consequentemente do sexo, é que ambos não são encarados naturalmente. A letra de uma famosa canção popular diz “o amor é divino, o sexo é pagão”, o “amor é isso, sexo é aquilo”, sempre aludindo à diferenciação e a separação entre eles. Talvez se trate de uma crítica irônica à concepção equivocada de amor e sexo, onde ambos aparecem como opostos irreconciliáveis.
Porém, se encararmos naturalmente o sexo, sem qualquer filosofia que o explique, e o amor, sem qualquer conceituação que o defina, nem contra e nem a favor um ou ao outro; se conseguíssemos encará-los do mesmo modo como olhamos para os nossos braços e cotovelos, por exemplo, amor e sexo seriam aceitos como algo natural, algo que faz parte de nós, de nossa constituição básica, de nossa natureza.
A compreensão correta de que amor e sexo constituem uma unidade inseparável, pode tornar-se uma via para a realização divina. Quando isso acontecer, o ato sexual não será mais um “fazer”, porém, um “estar", e um "ser”. Fazer significa “executar, exercer, cumprir”; quem faz algo é o “fazedor”. O “fazedor” é aquele que se move no tempo: “eu faço, eu fiz, eu farei”.
Mover-se no tempo é deslocar-se do passado para o futuro, do “eu fiz” para “eu farei”. Pois o “eu faço” não implica, necessariamente, que “estou fazendo”, porém, trata-se de uma locução, que tanto pode significar que “eu já fiz” ou “eu ainda farei”. Ou seja, é o “eu” que se desloca entre o passado e o futuro, e segue a horizontalidade do tempo, nele permanecendo.
Esse “eu fazedor” sempre carrega um propósito. Mas é importante compreender isso: não há um propósito para amor e sexo. Eles não são meios para se alcançar um fim. O amor é um fim em si mesmo, e o sexo a sua maior expressão entre aqueles que se amam. Amor e sexo é plena liberdade.
Qualquer tentativa de dar-lhes um significado ou um propósito, para além daquilo que é, criará uma tensão na unidade amor/sexo e, por consequência, suscitará a distinção, a separação, a frustração, o aprisionamento e o ressentimento.
Isso quer dizer que o ato sexual com a “intenção de”, ou amar com a “finalidade de”, são grandes equívocos que geram apenas perturbações no fluxo natural da vida. Amor e sexo não se unificam na horizontalidade do tempo, pois eles não se realizam no passado ou no futuro.
Para quem ama, não há passado e nem futuro. Diz-se que os “amantes são cegos”; de fato, pois eles apenas entregam-se ao amor, sem qualquer angústia pelo que passou ou expectativa pelo que virá. Eles não calculam o que poderão ganhar ou o que estão perdendo. O verbo “estar” implica em uma condição transitória, de passagem.
Por isso, amor e sexo não fazem parte do tempo, porém, pertencem à eternidade. Quando amor e sexo, em sua unidade inviolável, realizam-se em uma entrega consciente, tudo se torna aquilo que é; e aquilo que é não é o que passa ou o que virá, pois é o que sempre está aqui, no eterno agora.
Quando nos entregamos nesse aqui e agora, nada fazemos, pois tudo apenas é, sem mistérios, sem segredos. Não há objetivos a perseguir ou metas a cumprir. Quanto mais nos entregamos no agora, quanto mais nos aprofundamos na essência da vida, mais nos realizamos no divino. Isto é a vida eterna, isto é yoga.
A vida eterna, assim como amor e sexo, portanto, não se encontra na horizontalidade do tempo, onde vagamos, perdidos e neuróticos, do passado para o futuro; ela pertence a outra dimensão, a da verticalidade do presente.
A vida eterna é a própria presença divina em nós. Quando estamos na dimensão do eterno, do divino, nos movemos verticalmente: pois, aos nos aprofundarmos, nos elevarmos. Há de se compreender isso, para se compreender a unidade amor e o sexo como a realização divina.
Quando conhecermos o que é o amor – não porque nos disseram, não aquilo que está nos livros – mas por nossa própria experiência sensível, quando a consciência abrir-se ao amor, então o sexo será uma possibilidade de saída do domínio da banalidade do tempo e entrada no “infinito particular”.
Pois o amor é aquele algo mais amplo e profundo que, como seres humanos, podemos provar do divino. Assim, amar no tempo é impossível, pois o amor não pertence ao tempo. Por isso muitas pessoas se frustram com o amor, se frustram com o sexo. Tentam aprisiona-los com o que se viveu no passado, ou esperam que ele aconteça no futuro. Mas o amor é atemporal, pois sempre está no aqui e agora da eternidade.
Ao amar, portanto, penetramos na eternidade. Sair do tempo e entrar na eternidade é sair do “eu faço”para, simplesmente, ser: ser a carícia, ser o abraço, ser o beijo, ser o próprio ato, ser o próprio amor. Apenas ser. O verbo “ser” expressa um estado de permanência. Ou seja, permaneça no amor, seja o próprio amor.
Pois no amor não existe ego, não há lugar para o egoísmo. O ego se move apenas no tempo, e não se entrega a nada. Mas o amor é uma entrega total, uma libertação dos “meus desejos”, daquilo que “me agrada”; é sair do controle do “eu faço” para viver a plenitude do aceitar-se, permitir-se, dissolver-se no "outro".
Mover-se no sexo sem ser por ele subjugado, é mover-se com plena consciência. Sexo é "estar". O verbo “estar” implica em uma condição transitória, de passagem. Sexo é estar inteiro no aqui e agora da eternidade; é uma meditação profunda; não é alívio fisiológico ou válvula de escape psicológico; sexo é harmonia, é espiritualidade latente, é vida eterna.
Quando permanecemos na dimensão da eternidade, não há antagonismo entre natureza e espírito; não há oposição Terra/Céu, Humano/Divino, Macho/Fêmea, Matéria/Espírito, Dia/Noite, etc. Não há antagonismo entre amor e sexo, pois o sexo é a manifestação sublime do poder criativo do amor. Não há qualquer tabu. Isto é o “saber a coisa certa”.
Yoga é liberdade, é consciência. Estude, pratique. liberte-se.
Hari Om Tat Sat.
O ato sexual não é uma técnica e nem exige esforço. É algo espontâneo, natural. Não é para ser pensado, é para ser realizado, é para ser pleno. É uma brincadeira entre amantes, um permitir-se o florescer do amor. No sexo não há mente, pois a mente desvia para o passado e o futuro. Use o corpo, deixe a energia fluir, flutue na reciprocidade do contato. Sexo não é excitação para alcançar o pico, mas uma experiência do vale. A experiência do vale é ascensão, é a criação de um novo ser humano. De um ser humano que superou o tempo, o egoísmo, as dualidades da existência; um ser humano que adentrou uma dimensão em que o sexo, em si, desapareceu, restando apenas a sua essência, o amor divino (Bhagwan Shree Rajneesh - Osho)
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